terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

DESSECAMENTO DO RAQUIS DA UVA




                 O  dessecamento do raquis é uma alteração que pode ser enquadrada no grupo das doenças fisiológicas. Os sintomas não são devidos a patógenos ou pragas, mas sim a uma alteração fisiológica que obstrui o fluxo regular de carboidratos e água numa certa altura do raquis. Esta interrupção causa danos à uva tanto na quantidade como na qualidade.

                A correta identificação dos sintomas desta anomalia é importante, porque sobre o raquis podem se desenvolver outros fungos (como Botrytis) que pela sintomatologia se confundem com os do dessecamento do raquis.

                O sintoma desta alteração tem características bem definidas de manchas necróticas que inicia com a maturação da uva aparecendo sobre o raquis e segue sua evolução com o murchamento parcial ou total do raquis.

                O dessecamento do raquis pode ser causado por uma série de fatores resumidos em dois grupos: fatores climáticos e desequilíbrio nutricional vegetativo,  produtivo e hormonal.

                Fatores climáticos = quanto aos fatores climáticos, à literatura cita que a queda de temperatura durante o período da floração e chuva intensa durante o início da maturação são fatores que predispõem o aparecimento dos sintomas do dessecamento do raquis.

                  Outro fator que influencia o aparecimento desta fisiopatia é a alternância climática: ou seja, a ocorrência durante a estação vegetativa de mudanças repentinas das condições meteorológicas que interferem no estado vegetativo e funcional da planta.



                Desequilíbrio nutricional = Também a quantidade de elementos minerais podem influir no aparecimento desta fisiopatia. Estudos indicaram que a alteração da relação potássio (em excesso) e cálcio e magnésio (em deficiência) podem determinar a ocorrência do dessecamento do raquis. Cálcio e magnésio são elementos fundamentais para a fisiologia da planta. O cálcio principalmente é importante para a estrutura das células do raquis e das bagas. Devemos salientar também que a alteração pode ocorrer embora quando o  nível de cálcio e magnésio são ótimo, quando estes elementos não são disponíveis a planta devido à excessiva presença de potássio que obstrui a absorção.

                Influência do porta-enxerto

                Estudos indicam a influência que os porta-enxertos podem ter no dessecamento do raquis, seja devido à absorção de vários elementos nutritivos, seja devido ao vigor que imprimem a videira. Existem estudos que confirmam a maior predisposição a fisiopatia do porta-enxerto SO4 devido à dificuldade que este porta-enxerto tem em absorver magnésio e embora menos evidente também de porta-enxertos que conferem excessivo vigor como o Kober. No entanto, com o uso dos porta-enxertos 101-14 e 420A não foi observada incidência desta fisiopatia.

                Influência do vigor  e da produtividade = Os fatores que influenciam o aparecimento desta fisiopatia são múltiplos e ainda não bem definidos, mas com certeza se pode afirmar que o vigor e a alta produtividade predispõem o aparecimento do dessecamento do raquis. De fato, nos vinhedos vigorosos a presença de cachos atacados com o dessecamento é sempre maior, assim como a carga produtiva, ou seja, a quantidade de uva por planta.

                Desequilíbrio hormonal = Estudos recentes confirmaram a relação entre o dessecamento do raquis e as diversas concentrações de fito hormônios entre os ramos e os cachos. Em condições de alto vigor, de fraca frutificação e de estresse fisiológico a síntese de auxina e giberelina é maior no ápice vegetativo e menor nos cachos, isto determina condições fisiológicas favoráveis ao aparecimento do dessecamento.

                Intoxicação por compostos nitrogenados = No Chile, a hipótese mais aceita é da intoxicação por compostos nitrogenados amônio e putrescina. Estudos realizados com diversas variedades de uva de mesa indicaram maiores concentrações de amônio e putrescina em plantas afetadas do que em plantas sadias. As concentrações tóxicas de ambos os compostos diferem conforme a variedade. Tanto o amônio como a putrescina estão envolvidos no metabolismo do nitrogênio (a putrescina é sintetizada em maior quantidade quando ocorre a desintoxicação do amônio, quer dizer, quando o amônio é assimilado para formar compostos nitrogenados inócuos), de tal forma que é difícil determinar qual dos compostos está mais comprometido com a intoxicação. Também o potássio parece estar envolvido na intoxicação por amônio e putrescina. As plantas sensíveis à toxicidade acumulam menos potássio no raquis que aquelas mais resistentes.

                Num experimento realizado no Chile por Ibacache, verificou que a concentração de amônio, nitrato e nitrogênio total foi significativamente maior no raquis de cachos afetados. O mesmo ocorreu com o teor de amônio e nitrato no pecíolo das folhas.

                Embora a intoxicação por amônio seja bem conhecida nas plantas, às causas bioquímicas exatas e as concentrações específicas que causam o dano não são bem claras. A tolerância das plantas ao fornecimento externo ou a acumulação interna de amônio é baixa.

                Ações preventivas = A luz do que foi exposto a prevenção do dessecamento do raquis pode ser assim resumido:

                - Principalmente nas regiões sujeitas a esta fisiopatia deve ser considerada a condução em espaldeira.

                - Evitar o uso de porta-enxertos como o SO4 sensível ao dessecamento do raquis e preferir porta-enxertos que em função da fertilidade do solo não induza excessivo vigor.

                - Em vinhedos em produção evitar as técnicas que favoreçam o vigor e o crescimento vegetativo. Particularmente ter atenção com a adubação nitrogenada, a poda drástica e ao desponte e desfolha excessiva. Neste contesto muito cuidado também com a irrigação que atenda a real necessidade da videira. Importante evitar condições que causem estresse a planta.

                - Quanto à intervenção direta, ou seja; tratamento foliar é oportuno lembrar que se baseia na prevenção no senso que, quando os sintomas são visíveis, não existem produtos que bloqueiem ou curem o desenvolvimento do dessecamento. Para prevenir o aparecimento dos sintomas aconselha-se 2 a 4 intervenções foliares por ciclo vegetativo com formulações que contenham magnésio. A primeira intervenção deve ser logo no início da maturação, e as outras sucessivamente espaçadas de 8 a 10 dias. Obviamente que estas não são intervenções que resolvam o problema, mas ajudam a equilibrar o nível nutricional. Nas regiões e nos vinhedos suscetíveis, em anos em que o florescimento é longo e difícil (muita umidade e/ou frio), é oportuno antecipar os tratamentos com magnésio, iniciando logo após a floração, início da formação dos frutos.

                - Quando no solo o teor de magnésio é baixo, verificado através de análise foliar ou de solo, a aplicação de sulfato de magnésio no solo pode ser benéfica. Obviamente deve ser  avaliada a situação da disponibilidade de potássio no solo devido a sua ação antagônica com cálcio e magnésio.        

                - Conforme foi visto, para o surgimento do dessecamento é importante o relacionamento entre auxinas e giberelinas. Estas últimas são substâncias utilizadas para o alongamento dos cachos em variedades de cacho compacto. O seu emprego em variedades sensíveis ao dessecamento do raquis foi testado mas não deu o resultado esperado.

                - Existe a opinião generalizada que o dessecamento do raquis ocorre principalmente em vinhedos vigorosos ou em setores do vinhedo com abundante sombra. Portanto, para minimizar o efeito desta desordem fisiológica recomenda-se evitar o vigor excessivo da vegetação. Isto significa, deve-se efetuar um manejo adequado da fertilização (principalmente da nitrogenada).



BIBLIOGRAFIA

CAINELLI, R., MARGONI, M., MATTEDI, F., PENNER, F. e RIBOLLI F. - Dissecamento del rachide su             vitigno Marzemino,  analisi del problema. Ufficio Viticola Vallagarina. 2006.

CAVALCANTI, F.R. - Árvore do Conhecimento, Uva para processamento. Vasculares e radiculares.            Ageitec. Agencia Embrapa de Informação Tecnológica.

IBACACHE, A., G - El problema del pallo negro. INIA Intihuasi. 2006.

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KENNELLY, M., O'MARA, J., CARY, R.G., LEE MILER, G. & SMITH, D. - Introduction to Abiotic Disorders in    Plants. The Plant Health Instructor. DOI: 10.1094/PHI-I-2012